Quanto ao assunto do momento do “bebé sem rosto” e em virtude de algumas notícias que têm saído na comunicação social, fomos instados por alguns associados a tomar uma posição clara relativamente à execução de exames ecográficos, sobretudo face a declarações do Dr. Luis Semedo da APRANEMN (RTP3, programa 18/20) referindo genericamente que exames ecográficos executados por pessoal não médico coloca em risco a vida dos utentes. Refere também “no caso concreto dos exames de diagnóstico por imagem (…) podem e dever ser realizados (?) por médicos”.
Quanto a este assunto temos de dizer, antes de mais, que concordamos perfeitamente que tem de se combater o exercício inqualificado, mas que os Técnicos Superiores de Radiologia não se incluem nesse leque dada a sua atual formação académica e diferenciação. Da parte da APMIR temos feito o possível, perante as denúncias que nos têm chegado, apesar de não termos o poder de regulação de uma Ordem (que foi chumbada recentemente no parlamento e reprovada pelo CNO). No caso particular destas declarações que visualizamos, estamos em crer que se trataram de generalizações incorretas e lapsos decorrentes de uma entrevista em direto, pois certamente que não se estariam a referir que todos os profissionais não médicos não têm formação para executar ecografias e que todos os exames de diagnóstico por imagem têm de ser feitas por médicos. Tal como só pelo facto de ser médico (de qualquer especialidade, ex. psiquiatria? Dermatologia? ….) lhe dá qualificações para fazer ecografia, pois para se fazer ecografia é necessária formação formal teórica, prática e em contexto clínico e obviamente nem todas as especialidades médicas a tiveram. No caso particular dos Técnicos Superiores de Radiologia, precisamente por não serem médicos, o seu trabalho requer sempre validação e relatório da parte do especialista, no caso das ecografias ortodoxas/programadas. Por isso quando fomos instados a reagir não queríamos valorizar muito esta questão.
Mas não podemos deixar de ver com alguma estranheza de como se transpõe a discussão de um caso que envolveu um médico, para outros profissionais não médicos com formação superior própria, carreira própria e regulamentação própria (sendo urgente uma Ordem, obviamente) quando existem profissionais por exemplo da área da Cardiopneumologia e das áreas da Imagem Médica e Radioterapia (especificamente de Radiologia) que executam estes exames há largos anos (Ecocardio, Doppler, MSK, POCUS, etc), sempre em estreita colaboração com os médicos das diferentes especialidades.
Estranhamos também porque neste caso em particular a suspeita das malformações surgiu precisamente por ecografia “5 D” executada por um profissional não médico (por acaso uma colega Técnica Superior de Radiologia), e como sabemos, pela legislação portuguesa atual, essas ecografias não são diagnósticas, fato a que somos alheios e temos lutado que pelo menos sejam feitas por profissionais das áreas da IMR /Radiologia e não pessoal com formação indiferenciada, avulsa ou não certificada.
Aproveitamos então estas declarações para aclarar a posição da APIMR relativamente à execução de exames ecográficos por profissionais da Radiologia (IMR), que nem sempre é compreendida, nem tão pouco conhecida por parte de alguns dos médicos da referida especialidade.
1- Os profissionais da IMR (onde se inclui a Radiologia) são profissionais de saúde detentores de grau académico de Licenciatura desde 1999, pela portaria nº 505-D de 1999, correspondente ao nível 6 de Qualificações, para poder exercer a sua profissão.
2- A esmagadora maioria das escolas superiores do país tem a disciplina semestral de ecografia nos seus planos de estudos, com formação prática e locais para estágio.
3- De acordo com o Decreto-Lei 564/99 (em atual revisão), este profissional está habilitado para a realização de todos os exames da área da radiologia de diagnóstico médico, onde se inclui a ecografia.
4- A carreira de Técnico de Diagnóstico e Terapêutica foi revogada e substituída por a de Técnico Superior de Diagnóstico e Terapêutica, pelo Decreto-Lei 111/2017, sendo que esta tem complexidade funcional de carreira de grau 3 (Licenciatura ou grau académico superior) de acordo com a Lei 12-A de 27 de Fevereiro de 2008.
5- O seu perfil profissional (DL111/2017, artigo 5º) visa “actuar em conformidade com a informação clínica, pré-diagnóstico, diagnóstico e processo de investigação ou identificação, cabendo-lhes conceber, planear, organizar, aplicar, avaliar e validar o processo de trabalho no âmbito da respetiva profissão, com o objetivo da promoção da saúde, da prevenção, do diagnóstico, do tratamento, da reabilitação e da reinserção.”
6- Tal como nos primórdios, outros exames imagiológicos (Radiografias, TAC, RM…) eram executados por médicos e depois essas competências foram sendo delegadas a Técnicos devido à sua progressiva diferenciação académica e profissional. Também acreditamos que a evolução “natural” será que o mesmo aconteça com algumas ecografias à semelhança de países como Inglaterra, EUA, Austrália (países com qualificações semelhantes) onde há extensa literatura nesse sentido.
7- Os Profissionais da IMR, em particular da Radiologia SEMPRE, se mostraram dispostos a entrar na ecografia numa perspetiva de colaboração e complementaridade, sendo que os exames executados pelos mesmos teriam de ter sempre relatório e/ou validação pela parte de um clínico da especialidade. Quando isso não acontece é por manifesta recusa e/ou pela falta de diálogo parte dos mesmos o que levou a que outras especialidades médicas entrassem nesta área.
8- Da nossa parte, SEMPRE quisemos colaborar para que a Ecografia não “saísse” dos serviços de Radiologia e fosse parar a outras especialidades, infelizmente esta falta de diálogo e incompreensão levou ao paradigma atual de múltiplas especialidades médicas que utilizam a ecografia (sobretudo nos últimos 15 anos), muitas com formação formal inferior quer à dos Médicos Radiologistas quer dos Técnicos Superiores de Radiologia.
9- Reduzir este debate a uma perspetiva corporativista só vai aumentar ainda mais o alarme social que o caso em epígrafe já gerou e também tensões entre classes profissionais onde é essencial que estejam em estreita colaboração.
10- Se houve profissionais que quebraram a cadeia normal de acontecimentos não fomos nós, já que, como referido, não somos médicos, e como tal não somos nós que recebemos os utentes, fazemos os exames e passamos o repetivo tratamento ou medicação. Portanto se houve uma mudança de paradigma e atalhos na cadeia de acontecimentos, certamente que não fomos nós que contribuímos para tal.
11- Quanto a possíveis erros ou análises erradas todos os profissionais estão sujeitos a isso e concordamos que aumentando os critérios formativos se vá diminuindo a probabilidade de errar, nesta e em qualquer área da saúde. Aliás, achamos que uma colaboração mais próxima médico /técnico poderia contribuir para isso, da nossa parte sempre tivemos essa abertura.
Para finalizar todos nós, como profissionais de saúde queremos trabalhar em equipa e dar o melhor de nós e das nossas capacidades para ajudar os utentes a melhorar o seu estado de saúde contribuindo para o diagnóstico. Se é verdade que reconhecemos o nosso papel, forças e fraquezas, não podemos aceitar que ainda nos coloquem num papel subalterno e subserviente de há 40 anos, quando de lá para cá a nossa profissão e qualificação evoluiu tanto.
Sempre disponíveis para esclarecimentos adicionais
A Direção Nacional
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